sábado, 26 de dezembro de 2015




MOONSPELL – WOLFHEART

Correndo o risco de cair em erro, por não conhecer o cenário mais profundamente, creio que o Moonspell seja a maior banda de metal surgida em Portugal. É uma sensação que provavelmente pode ser análoga ao que ocorreu com o Sepultura, quando despontou para o mercado mundial. Na crença de muitos estrangeiros, o Sepultura seria a única banda de metal do Brasil, o que estava muito longe de ser verdade. Antigamente essa atitude poderia até ser interpretada como desrespeito ou desdém, vindo de lá pra cá, mas quando a gente se coloca no outro lado, como podemos fazer agora em relação às bandas portuguesas, vemos que não é bem assim. Estamos, de certa forma, condicionados ao que a mídia especializada adota para divulgar e nos acomodamos um pouco com essa fonte de informações, sem dedicarmos nosso tempo – já tão escasso – para rastrear, por conta própria, coisas novas ou diferentes.
Porém, de modo algum isso deve ser dito como sugestão de que o Moonspell não merece o destaque que tem. Merece, e muito! E esse mérito não tem nada a ver com sua origem. Nesses vinte anos percorridos entre o lançamento desse seu primeiro disco, precedido apenas por um EP datado do ano anterior, até hoje, a banda é um ser em constante evolução, inovando e desafiando limites sem, porém, nunca se afastar de seu estilo.
E o estilo dos lusitanos é uma mescla bem dosada de metal gótico, com acréscimo de doses de black metal, tudo emoldurado por elementos da cultura portuguesa, reforçados pelo fato da banda utilizar tanto o idioma pátrio quanto o bretão em suas canções. Todas essas características já se fazem presentes na primeira música, Wolfshade (A Werewolf Masquerade), sendo que os toques de black metal podem ser identificados na interpretação do vocalista Fernando Ribeiro, que também alterna suas performances com momentos mais melódicos, fazendo uso de seu timbre naturalmente grave.
A partir desse álbum, a formação do Moonspell se estabilizou, havendo rotatividade apenas no posto de baixista, que por algum período chegou a ser ocupado pelo brasileiro Sérgio Crestana. Apesar disso, o que se percebe a partir desse álbum de estreia, é o entrosamento de uma banda bem direcionada, com talento e carisma suficiente para tornar grandiosas músicas de estruturas razoavelmente simples. Wolfheart chama atenção logo a partir da capa, agressiva, fria e bela, e que lhe incita a querer conhecer o conteúdo musical nela contido. Gostando-se ou não de metal com elementos góticos, não há como ficar impassível ante canções tão fortes quanto Alma Mater, An Erotic Alchemy ou Vampiria, todas tão cativantes que acabam por parecerem ser mais curtas do que realmente são. A música Of Dream and Drama (Midnight Ride) apresenta alguns elementos de interpretação que remetem a algumas coisas feitas por Glenn Danzig, quase como se esse estivesse cantando alguma canção dos primórdios do Paradise Lost.

Eu compreendo, e na maioria das vezes concordo, que os rótulos gothic metal e black metal tendem a afastar o interesse de alguns. No entanto, na forma como eu vejo, o Moonspell não está preso a esses nichos, e nem a nenhum outro. É uma banda criativa e que, a cada ano, consegue avançar e incorporar novos elementos dentro de suas propostas. Merece, por isso, ser conhecida, antes de ser pré-julgada. Wolfheart ainda é a melhor porta de entrada para a sua discografia.

sábado, 19 de dezembro de 2015



LYNYRD SKYNYRD – PRONOUNCED LĚH-NÉRD SKIN-NÉRD

Vou começar invertendo a sequência natural das coisas e falando logo de Freebird e do que ela me transmite. Antes de mais nada, tem que ser registrado que Freebird é uma daquelas músicas que transcedem da existência de seus criadores, tornando-se um ser independente da banda. Ela está acomodada tranquilamente entre tantas outras canções que viraram hinos da música. E talvez nem fosse assim caso ela soasse de outra forma, distinta de como soa. Freebird é, para mim, uma espécie de milagre de produção. Eu não consigo escutá-la e absorver a idéia de que foi gravada no ambiente frio de um estúdio, provavelmente em takes diversos. Ela soa muito viva, muito livre, com a permissão do trocadilho. A interpretação da música, perpetuada nesse primeiro disco do Lynyrd Skynyrd, tem espontaneidade e emoção condizentes com a de uma performance ao vivo, em uma noite inspirada, e o fato de possuir aquele que é, para mim, um dos cinco melhores solos de guitarra já registrados para uma canção, a torna ainda mais grandiosa.
O que eu disse para Freebird pode também ser lido para Simple Man e Tuesday Gone, que são os outros dois grandes clássicos desse disco. Das três, Simple Man é a mais compacta, em termos de duração, mas Freebird e Tuesday Gone ultrapassam o formato radiofônico e assumem as características de jams. Ambas são parcerias do vocalista Ronnie Van Zant com o guitarrista Allen Collins, embora ele só assuma o solo na primeira, deixando o solo da segunda com o colega Gary Rossington.
 A estreia do Lynyrd Skynyrd apresentou ao mundo uma banda absolutamente segura, com um som tão robusto quanto o era a sua formação em septeto, com três guitarristas dividindo as funções de solista ao longo das faixas. O grupo, originário da Florida, é um dos grandes baluartes e referências do rock sulista americano e fez um trabalho tão primoroso que sequer parecia que esse ainda era apenas o seu primeiro álbum. Como é característica de muitas bandas desse cenário, o Lynyrd Skynyrd não tem um vocalista com alcance além do extraordinário, tão prolíficos naquela década de setenta, mas tem, na figura icônica do saudoso Ronnie Van Zant, um vocalista inspirado, além de excelente letrista, adequado ao estilo que a banda executava, e com o tipo de voz que contribuía para deixar as músicas com aquele sabor especial de bourbon.
A origem da banda não poderia alienar os músicos de suas raízes, daquilo que já foi feito de melhor naquela região do país, que é o blues. Por isso soa mais que perfeita a dobradinha entre as canções Things Going On e Mississipi Kid, que mergulham fundo nesse tipo de sonoridade. Equilibrando o disco, ao lado das canções mais blues e das mais emotivas, está o lado hard rock da banda, representado nas faixas I Ain´t the One, Poison Whiskey e na também clássica Gimme Three Steps.

É claro que sempre vem à lembrança a tragédia que abalou o grupo anos depois e afetou a sua carreira, mas o Lynyrd deve ser lembrado, sempre com mais ênfase, no que proporcionou ao mundo em seus primeiros anos. Fazendo música pela música, de uma forma que apenas um seleto grupo de bandas, nas quais eu incluo Led Zeppelin, Free e Grand Funk Railroad, sabia executar, unindo emoção, simplicidade e dinâmica, formatando, em definitivo, as tendências musicais mais emblemáticas do rock no começo dos anos setenta. 

sábado, 12 de dezembro de 2015



TNT – KNIGHTS OF THE NEW THUNDER

Confesso que, em relação a esse disco, ocorreu uma lacuna na minha formação musical. Mas, também, não dá pra escutar tudo, não é? E se isso é verdade hoje, nos idos tempos também era.
Mas eu explico. Esse disco estava sempre na prateleira das lojas, esperando por quem o levasse. Eu o manuseava, admirava a capa, o título, tudo muito legal e de bom gosto, mas, no momento de disputar o salário de estagiário, ele sempre perdia a disputa com os nomes mais populares disponíveis, tipo Dio, Ozzy, Iron Maiden, AC/DC, Saxon, Scorpions, Black Sabbath, Accept ou Judas Priest. Além desse detalhe, pesou também o fato de que nenhum de meus amigos mais próximos, com os quais eu emprestava discos ou gravações, tinha esse album. Ele sequer era mencionado nas conversas e, portanto, a passagem do tempo fez com que eu acabasse por esquece-lo em definitivo.
Até que, vários anos depois, após o vento ter feito com que voassem as folhas do calendário, um de meus amigos mencionou o disco em um tópico do orkut, usando a palavra “discaço” para defini-lo. Foi o momento em que me voltou à lembrança a existência da banda e o fato de nunca ter escutado o disco. Felizmente, lapsos dessa natureza podem ser preenchidos a qualquer tempo e esse foi o caso. O disco, lançado pela banda norueguesa TNT, transita muito próximo do modo americano de fazer hard rock, puxando mais para o lado AOR do estilo do que para o lado espalhafatoso que muitas bandas do estilo gostam de praticar. Essa pegada mais sóbria já fica clara a partir da primeira música, Seven Seas, que é na verdade um hino, daqueles perfeitos para fazer o encerramento de um show.
Mas Knights of the New Thunder é também um disco de heavy metal e, quando a banda ataca com essa intenção, ela soa bem na linha Judas Priest, como fica transparente logo no começo de Ready to Leave. Essa faixa, por sinal, mescla o lado heavy metal com o hard rock, utilizado no refrão, de maneira muito inteligente, fazendo uma fusão natural, sem que pareça que são duas bandas distintas ocupando a mesma capa de disco.
Poucos povos tem mais autenticidade para falar de Thor do que os noruegueses, e essa herança cultural é responsável por uma das faixas que, só não é ainda melhor, porque é muito mais curta do que poderia ser. Thor with the Hammer é um destaque dentro do álbum e tem mais um refrão excelente. Assim o são também a hard Break the Ice e a rápida Deadly Metal, onde a influência do Judas Priest aparece de novo com bastante evidência. A última música do disco, Knights of the Thunder, faz o seu papel de encerramento com muita categoria, pois tem uma palhetada marcial, circundada pela melodia central, que transmite um clima épico carregado de dramaticidade.

 Não é, portanto, o caso de lamentar não ter tido contato com o álbum em sua época de lançamento, afinal, se isso fosse um problema, eu estaria lamentando por cada banda setentista que eu descobri, ou continuo descobrindo, tardiamente. Se ainda estamos falando em TNT, isso é resultado de eles terem concebido esse excelente disco. Ou melhor, esse discaço!

sábado, 5 de dezembro de 2015



OZ – FIRE IN THE BRAIN

Em algum momento, no começo dos anos noventa, a Finlândia, tal qual sua vizinha Suécia, ambas na região européia conhecida como Escandinávia, tiveram uma explosão de bandas que fez com que os radares do heavy metal mundial se voltassem para acompanhar o que estava acontecendo ali. A Suécia teve uma explosão maior, mas a Finlândia revelou nomes que hoje estão entre os mais lembrados do estilo, com uma forte base de fãs, tais quais Amorphis, Children Of Bodom, Impaled Nazarene, Nightwish, Sinergy, Sonata Arctica, Stratovarius e Turisas.
No entanto, lá no começo dos anos oitenta, na fase áurea do estilo, surgiu uma banda naquele país que, antes, só era lembrado em termos de música pesada por causa da existência do Rattus, grupo seminal do hardcore. A tal banda, denominada Oz, não extrapolou os limites do underground, mas fez um trabalho de qualidade, que é o foco aqui. Fire in the Brain, lançado em 1983, é o seu segundo disco, e é considerado o clássico de sua discografia.
A Primeira vez que eu tive contato com o grupo foi também nos anos 80, através de uma fitinha cassete gravada por um amigo, no formato de coletânea. Não me lembro de tudo que tinha na tal fita, mas sei que tinha Manowar, Trouble e Mercyful Fate, além do Oz. A música do Oz selecionada para a coletânea foi a faixa de abertura do disco Fire in the Brain, Search Lights, impossível de ser esquecida por causa do grunhido que marca sua introdução. A faixa era excelente, mas demorou quase vinte anos para que eu pudesse conhecer o resto do disco e, devo dizer, a espera valeu, pois todas as composições do álbum são de muito bom gosto. Metal tradicional em grande forma, lembrando fortemente o que os holandeses do Picture também estavam fazendo.
Não consigo vislumbrar nenhuma outra comparação, mais precisa do que a com o Picture, para poder situar quem ainda não conhece esse disco. A faixa Fortune é bem sintomática em relação a essa semelhança, mas isso em momento algum quer dizer que o Oz imitava aquela banda. Tanto uma, quanto a outra, soam dessa forma porque ambas trabalhavam em cima do que existia de melhor em termos de heavy metal naquele tempo. Mais precisamente falando, a escola britânica, conhecida como New Wave of British Heavy Metal, que agregava peso sem extremismo com melodia sem afetação.

Esse não é um daqueles discos que mudaram o curso das coisas, apontaram novos caminhos para o estilo ou qualquer outro tipo de quebra de padrões. É um disco honesto de metal. De bom heavy metal, do tipo que hoje em dia só se encontra em bandas revivalistas. Portanto, nunca deixe de explorar o passado, ao mesmo tempo em que percorre o presente, pois a fonte é infinita e tudo acaba por se mesclar. Se duvidar, ouça o disco e veja que músicas como Black Candle, Gambler ou Megalomaniac não envelhecem. Soam tão bem como devem ter soado trinta anos atrás, em um país que almejava ser visto no mapa mundi do heavy metal.