sábado, 4 de julho de 2015











SIGUR ROS - Ágætis Byrjun

Toda a produção de ficção científica é calcada, pura e simplesmente, na história e na realidade. Não há como a mente humana gerar algo que seja absolutamente alienígena. Tudo não passa da interpretação exagerada de costumes, roupas, arquitetura e demais pontos característicos de culturas - sob o ponto de vista do observador - exóticas (sem falar na antropomorfização de aspectos animais e vegetais).
Esse pequeno preâmbulo é apenas para que eu possa tentar explicar um pouco do estranhamento que tive ao ouvir o Sigur Rós pela primeira vez. Aquele sotaque e aquelas letras, com estruturas fonéticas tão estranhas para os ouvidos mais acostumados com as frases concebidas em língua inglesa e línguas latinas, chamam imediatamente a atenção para o inusitado. Soam, de certa forma, alienígenas. Mesmo canções em idiomas árabes, orientais ou da Alemanha parecem ser mais naturais aos nossos ouvidos, talvez por conta da forte presença desses povos em nosso país, mas a Islândia, nação de origem da banda, permanece como um lugar sobre o qual deveriamos aprender mais. Trata-se de um país nórdico insular, distante e isolado, com paisagens de desertos gelados e geiseres ativos, e, quando visualizamos as imagens desses locais, percebemos que aquele meio ambiente influencia fortemente a forma como a música soa. As canções transmitem uma dose de melancolia tão associada a regiões frias quanto o reggae, por exemplo, pode ser associado a climas mais quentes. O sotaque em que as canções são entoadas, conforme já foi dito, pode até inicialmente causar uma distração da parte instrumental, mas não tarda para que essa também venha a lhe instigar, pela sua peculiaridade. Uma música como a faixa Svefn-G-Englar consegue lhe absorver plenamente, ao tempo em que lhe passa aquela sensação de estar tentando correr na água ou se movendo em um sonho. As próprias letras reforçam a sensação onírica, sendo bastante poéticas e casando perfeitamente com as melodias.
Apesar de ter bastante personalidade, em momentos esparsos do disco eu percebi semelhanças com algumas coisas feitas pelo Smashing Pumpkins (como em Staralfur), e, em outros momentos, era lembrado de um ou outro trecho mais climático do The Wall, do Pink Floyd (como em Hjartad Hamast). Como esse é o segundo disco da banda, me parece que o estilo do conjunto ainda estava em desenvolvimento, tanto que em álbuns seguintes eu já não consegui mais fazer essas associações de semelhança, reconhecendo-os apenas pelo estilo Sigur Rós de fazer música. E, para tentar situar quem nunca ouviu nada do conjunto, eu imagino que eles se encaixam mais apropriadamente no nicho do rock progressivo, embora a palavra “rock” caiba aqui apenas pela utilização convencional do termo. Eles, em muitos momento, irão resvalar no terreno da música ambiente. Uma faixa como Ný Batterí, cuja segunda parte é marcada por uma levada de bateria, transita entre esses dois mundos: o progressivo e o ambiente. E que fique claro que a tal levada não é algo com batidas de  impacto evidente, mas, no contexto completo do disco, a sua simples presença já surge como fator de destaque, fazendo uma pequena quebra na suavidade densa do som.
Enfim, é um disco MUITO bom e MUITO interessante, mas caso queira conhecê-lo, que fique claro: não é música para acompanhar com braços erguidos e palmas, não é música para pisar no acelerador do carro, não é música para embalar o bate-papo enquanto toma cerveja, embora, caso se queira, nada impede ninguém de fazê-lo. Pessoalmente, creio que ela seja mais adequada para a contemplação, o momento de sossego, ou para acompanhar a leitura de um livro. Talvez, um de ficção científica.

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