domingo, 22 de fevereiro de 2015



CLAMUS – FRONTIÈRE

É muita satisfação ser conterrâneo de uma banda que concebe um trabalho assim. Lançado em 2009, esse é, considerado por mim, um dos melhores discos de metal gerados naquele ano. Sim, porque seria desrespeitoso, com a qualidade do mesmo, classificá-lo apenas entre o que de melhor se fez no estado do Ceará, ou no Brasil. Frontière, do Clamus, é um disco que exemplifica o que nós já sabemos com propriedade: o cenário de nossa música pesada não deve nada a qualquer outro cenário, em qualquer perfil geográfico imaginado. Temos bandas profissionais, maduras e, melhor de tudo, com criatividade suficiente para explorar o estilo sem se prender as amarras das influências, reverenciando o passado mas olhando para o futuro do estilo.
É sintomático, portanto, quando a gente fala em transposição de espaços territoriais, ou de limites musicais, que o nome do disco seja Fronteira, na tradução para o português. Este é o segundo album da banda e seu lançamento marcou os dez anos de atividade do conjunto. De cara, a primeira característica que salta aos olhos em seu trabalho, além da apresentação gráfica bem concebida da capa e do encarte, é o fato do - à época quarteto - dividir seus arranjos vocais entre três dos músicos, revezando-se na função e utilizando, para tanto, três línguas diferentes! As composições passeiam entre o inglês, o francês e o português com uma naturalidade ímpar, como se aquilo fosse a coisa mais corriqueira do mundo, e dão a sensação de estar ocorrendo um verdadeiro debate coletivo de idéias em cada faixa, amplificado pela fúria com que as letras são proferidas. Essa inusitada atuação enriquece ainda mais a performance instrumental, que percorre a linha do thrash/death metal, com composições tão bem trabalhadas que perpetuam a relevância do trabalho.
O riff meio épico que começa a primeira música, Pétrea, é rapidamente substituído pelo death metal que prevalece na composição e prossegue, com mais fúria, na música seguinte, Abstratas Demandas, que tem um riff excelente na sua parte intermediária. O andamento thrash está em primeiro plano na terceira faixa, Irruption, também marcada pelas mudanças de andamento e pelas viradas na sua metade.
As duas próximas músicas são Mersault e Entr`Acte, sendo, essa última, um número  instrumental, com bastantes variações. Passando por La Frontière e Desir, chega-se em Sympatia Malevolens, cujos primeiros versos, cantados na língua portuguesa, dão um toque hardcore à composição. A última música, Mid-Term, tem um ótimo refrão pontuando a sua duração e, quem prestou atenção durante toda a audição do disco, pode ter percebido que a banda utiliza com parcimônia o recurso de inserir refrões em suas faixas, fazendo-o apenas em uma ou outra, o que não deixa de ser um posicionamento desafiador. Abre-se mão de uma ferramenta legítima na estruturação dos arranjos, mas compensa criando harmonias e mudanças tão fortes e variadas que mantém incólume a força e o carisma das músicas.

Influences, o primeiro album do Clamus, depois do seu EP de estréia, também é excelente e merece ser conhecido, mas foi realmente a partir de Frontière que eu me tornei fã e aguardo, sempre com muita expectativa, cada novo lançamento dessa banda que sempre corresponde com louvor ao alto nível que reina em sua terra de origem. Árida, no clima, mas rica na musicalidade.

domingo, 15 de fevereiro de 2015



MOTORHEAD – NO SLEEP ´TIL HAMMERSMITH

Esse foi o primeiro disco do Motorhead que eu ouvi. Tá certo que a banda tem uma infinidade de clássicos, mas não consigo imaginar melhor porta de entrada para sua discografia do que esse ao vivo. Tudo que você precisa saber sobre Motorhead está aqui e, de certa forma, tudo o que você precisa saber sobre um show de metal, principalmente para quem, naquela idade e naquela época, ainda não tinha vivenciado isso.
A doutrinação já começava pela capa, exibindo uma foto da formação clássica em trio, envolta por centenas de luzes que, curiosamente, não iluminam os músicos, envoltos em penumbra, ameaçadores, flagrados em um momento em que você sente que algo muito intenso está acontecendo ali em cima do palco. Para alguém que nunca tinha assistido uma banda de metal tocando ao vivo – e nem imaginava que algum dia iria assistir – aquela capa fazia viajar na intensidade de como seria esse tipo de evento. Discos ao vivo tinham esse poder, que hoje foi diluído, de lhe transpotar para o centro daquele momento e de lhe fazer imaginar o que estaria ocorrendo ao longo da apresentação, quantas pessoas estariam assistindo, como seria a reação delas...
E para ingressar no local, junto com aquele público, bastava colocar a agulha no disco! Nesse momento eu tenho que inverter a ordem natural e começar pelo lado B, da forma que eu conheci o álbum. Há um breve e suave momento de silêncio e então: tugudumtugudumtugudumtugudum... a mais onomatopéica de todas as levadas de bateria passa por cima de você, abrindo caminho para uma linha cíclica de baixo, com o agudo no máximo, até a explosão do começo de Overkill. Não importa que Lemmy fique repetindo que o Motorhead toque rock´n´roll porque, sejamos sensatos, isso não é rock´n´roll nem aqui nem em lugar qualquer! Isso é metal, extremamente intenso! Thrash ou pré-thrash, tanto faz, mas é metal! Era o ano de 1981 e Lemmy já era o ícone que conhecemos - sem que a imprensa precisasse ficar repetindo isso o tempo todo – acompanhado por dois outros caras tão icônicos quanto: Fast Eddie Clarke e Philthy Animal Taylor, compondo o trio que mostrou, com mais propriedade, que não haviam limites para a extrapolação. A música pode ser mais alta, o ritmo pode ser mais rápido, a melodia pode ser mais agressiva.
Até hoje eu não absorvi plenamente o impacto dessa faixa. Eu sempre vou me impressionar  a cada audição. Eu sempre vou querer que os seus falsos finais e recomeços se estendam por mais vezes do que as duas que ocorrem. Após o seu último acorde, um urro de Taylor é a deixa para We Are The Roadie Crew, transição necessária para que cheguemos até Capricorn, uma canção com um ritmo mais diferenciado dentro da discografia do Motorhead, com um leve toque de psicodelia lisérgica, amplificada pelo eco colocado na voz de Lemmy. A partir daí, o andamento torna a acelerar, com Bomber e o encerramento com Motorhead, música criada antes que o grupo nascesse, cuja primeira versão foi gravada pelo Hawkwind.
Passando agora para o lado A, o baixo de Lemmy é a primeira coisa que se escuta, na introdução de Ace of Spades, faixa-título do disco cuja divulgação gerou o presente show. Ela é imediatamente seguida por Stay Clean, onde Lemmy novamente passa à frente, com um solo de baixo histórico, deixando, a partir de então, que o concerto flua intercalando entre faixas cadenciadas, como Metropolis e Iron Horse, e faixas mais rápidas, como The Hammer e No Class.
Ao final, não importando em que ordem você escutar, fica a satisfação da participação virtual em uma apresentação da banda. Experiência que só era obtida na época em que os discos ao vivo faziam alguma diferença, principalmente, de certa forma, para nós brasileiros que naquele tempo éramos um ponto distante das rotas das turnês. Hoje, podemos vivenciar os shows in loco, e os discos desse tipo acabaram perdendo uma parte de sua força, ou pelo fato de terem se tornado meras peças de souvenir, ou por serem tão manipulados em estúdio que desvirtuam seu propósito. De qualquer forma, No Sleep ´Til Hammersmith não se enquadra nessas categorias e permanece histórico e essencial. Um documento que registra o poder e os efeitos da submissão a uma força da natureza chamada Motorhead.

domingo, 8 de fevereiro de 2015











SUICIDAL TENDENCIES – LIGHTS, CAMERA, REVOLUTION

Uma lenda. Sem exageros ou metáforas, mas é assim que eu percebo o SuicidaL Tendencies. Uma banda muito conhecida e pouco escutada, pelo menos entre meus amigos mais próximos.
É uma pena, porque trata-se de um grupo fantástico, com uma sonoridade única e que lançou, no mínimo, três clássicos indispensáveis: Join the Army, Still Cyco After All These Years, que é a regravação do também clássico primeiro disco, e este Lights, Camera, Revolution, cujo registro correspondeu ao período de maior popularidade experimentada em sua trajetória.
Merecidamente, aliás, pois esse é, de fato, um disco sensacional. Pesado, rápido, agressivo e, diga-se, extremamente divertido. Ficando bem claro que, divertido, aqui, está longe ser sinônimo de engraçadinho. O talento de Mike Muir, como compositor e letrista, não deixa que as músicas resvalem para essa seara, apesar de que esse mesmo talento seja o responsável pela constante autoreferência nas letras, com a palavra suicidal e suas derivações sendo constantemente mencionada, durante as canções, ao longo de toda a discografia da banda.
Mike, o líder da gangue, teve consigo, nesse trabalho, a formação mais entrosada de que já dispôs, com o baterista RJ Herrera, a guitarra solo de Rocky George, as bases thrash de Mike Clarck, e o baixo grooveado de Robert Trujillo, estando, este ultimo, no momento de sua carreira em que pôde melhor explorar sua personalidade como músico.
Falando de Trujillo, em separado, não dá pra deixar de registrar que é um dos melhores baixistas em atividade atualmente, mas, no Metallica, ele não tem espaço para executar as levadas funkeadas, carregadas de groove, que ele fazia em seus tempos de Suicidal, onde ele tinha mais liberdade e influência nas composições.  Ali, quando  esse tipo de linha de baixo surgia, ela conseguia funcionar a favor da música, já que a formação da banda, formada por negros e latinos, agregava suas diversas raízes musicais – sem soar forçado – dentro do hardcore thrash praticado. Mais tarde, essas misturam viriam a desencadear na criação do Infectious Grooves, que posteriormente viria a refundir-se com a banda original, culminando no Suicidal atual.
Mas, voltando ao presente disco, ele já abre com um clássico instantâneo: You Can´t Bring Me Down! Uma faixa fulminante, com um refrão perfeito e que, em sua parte intermediária, ainda permite que Mike faça o que mais gosta na vida: discursar! You Can´t permanece até hoje como a música de abertura dos shows e é uma das melhores da banda desde sempre. Só não ganha o título de melhor faixa do disco porque fica emparelhada com Alone, outra música excelente e que é um perfeito exemplo de thrash “cantável”. Algo que o Suicidal, da mesma forma que o Anthrax, consegue fazer como poucos dentro desse cenário.
Essas duas são seguidas de perto por Lost Again, Lovely e Send Me Your Money, compondo o suprasumo do trabalho, cujo restante, representado por faixas como Get Whacked, Give It Revolution e Go´n Breakdown, fazem, desse, um album fundamental, de uma banda que não só esteve na origem do crossover como conduziu-o para outros níveis, experimentando com sonoridades diversas, afastando-se dos nichos musicais que, inevitavelmente os manteriam apenas como uma boa promessa. Hoje, eles podem ser encarados como uma formação composta por Mike Muir e seus músicos contratados, mas, na época de Lights, Camera, Revolution, eles eram realmente uma banda. Aliás, perdão, eles eram uma lenda.




terça-feira, 3 de fevereiro de 2015



TOP 5 DISCOS DO DEEP PURPLE

1º Machine head
2º In rock
3º Burn
4º Perfect strangers
5º Stormbringer

domingo, 1 de fevereiro de 2015



ZZ TOP – DEGUELLO

Em um mundo ideal, eu não estaria escrevendo isso numa porcaria de teclado de computador. Estaria acomodado numa mesa de madeira, em um bar calorento, rabiscando em um guardanapo. E sorvendo o primeiro gole de whisky, é claro, porque, mesmo que você não estivesse pensando em beber, seu sinalizador de sede iria disparar logo aos quatro primeiros segundos da primeira música, I Thank You. O disco mal começa e já lhe traga pra dentro do modo de vida texano, explorado pela banda, com churrascos, mulheres e carrões. Não é a toa que a música seguinte se chama She Loves My Automobile.
Acho que nenhuma região americana tem bandas tão claramente identificadas, com o seu local, como o são as que compõem a cena sulista. O ZZ Top, porém, é um pouco diferente das demais. Ele não é tão country rock quanto o são, por exemplo, o Lynyrd Skynyrd ou o Allman Brothers, mas, por outro lado, têm os dois pés fortemente fincados no blues.
E blues é o que você vai encontrar em I´m Bad, I´m Nationwide, primeiro grande clássico do disco. Tão harmônica quanto o tilintar das pedrinhas de gelo em seu copo e que prepara o seu espírito para a beleza de A Fool For Your Stockings. Que música linda do inferno! Nesse momento você tem que completar sua dose, ou melhor, peça logo ao garçom para deixar a garrafa na mesa e esqueça de tudo ao redor, pois todos os seus demais sentidos tem que ser desativados em favor da utilização plena de sua audição. Essa música pode lhe deixar tão absorto que, quando inicia a seguinte, Manic Mechanic, é como se você fosse subtamente acordado no meio de um sonho, desorientado sem saber bem onde é que está.
O disco segue e quando chega em Hi-Fi Mama você já bebeu o suficiente e pode agora apreciar o tira-gosto. O momento de degustação combina com o fato dessa música – que é um rockão bem ao estilo do que de melhor se fez na década de 50 - ser a única do disco cantada por Dusty Hill. Billy Gibbons é um guitarrista soberbo, que não precisa de maiores apresentações, mas, se por um lado, ele é um gênio, Dusty é O cara! Ninguém segura um baixo como Dusty faz! Em suas mãos, aquilo não parece ser apenas um pedaço de madeira trabalhado – como o é para tantos – mas, sim, um verdadeiro companheiro fiel, algo digno de ser bem tratado e acariciado, tal qual um animal de estimação querido.
Cheap Sunglasses é outra faixa que é bem a cara da banda: uma levada cheia de malemolência e uma letra satírica, descompromissada. Lembre-se que você está curtindo uma garrafa de whisky, então nem pense em encontrar aqui letras com mensagens.  A banda está dizendo pra você se divertir. Siga o conselho: relaxe e curta.
O fim do disco está próximo. Esther Be The One é a última, mas não precisa ser o encerramento do momento vivido. Vá em frente, peça outra garrafa e ponha o disco pra tocar de novo, ou coloque qualquer outra coisa do ZZ Top. Não precisa, de modo algum, se preocupar com o dia seguinte. Música boa não dá ressaca.